Bicicleta evita o uso de ao menos 200 ônibus por dia em Belém, mas está fora do debate na COP30, dizem ativistas
Ciclistas da Grande Belém cobram investimentos em ciclovias, sinalização e rotas seguras para as bikes
Paráciclo
Uma pesquisa inédita sobre o uso da bicicleta em Belém mostra que o pedal é muito mais do que uma escolha individual: ele é parte central da mobilidade cotidiana na cidade que recebe a COP30. A contagem registrou bicicletas transportando 84.773 pessoas na semana da pesquisa — o equivalente a evitar, sozinhas, a necessidade de cerca de 200 ônibus circulando diariamente, segundo o relatório da Pesquisa Origem-Destino com ciclistas, realizada em 2025. Quanto mais bikes nas ruas, menor a emissão de poluentes na atmosfera.
Apesar disso, cicloativistas apontam que a mobilidade ativa praticamente não aparece na programação oficial da conferência da ONU sobre o clima, o que consideram um contrassenso diante da urgência em reduzir emissões e ampliar formas limpas de transporte.
No contexto da COP30, que acontece em Belém até o dia 21 de novembro, a bicicleta ganha ainda mais peso simbólico.
“Pedalar faz bem para o meio ambiente, porque é zero poluente; e faz bem para a saúde do corpo, porque é transporte ativo. Pedalar faz bem para o amazônida e bem para a Amazônia”, destaca Daniele Queiroz, presidente do ParáCiclo.
Ela reforça que, mesmo com o papel comprovado da bicicleta na redução das emissões e na inclusão social, a mobilidade ativa não aparece como eixo estruturante das discussões oficiais.
Para a União de Ciclistas do Brasil (UCB), a ausência do tema na COP é preocupante. “O transporte é um dos principais responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa. Ignorar caminhar e pedalar significa deixar de lado as soluções mais acessíveis, inclusivas e de baixo carbono que existem”, afirma Ana Carboni, conselheira da entidade.
Ela cita o manifesto da UCB, “Pedalando por Justiça Climática, Equidade e um Futuro Sustentável Possível”, que defende investimentos públicos consistentes em infraestrutura segura para quem anda a pé e de bicicleta — especialmente nas periferias e territórios historicamente negligenciados.
Como resposta à ausência da mobilidade ativa na agenda oficial, a UCB, o ParáCiclo e o Espaço Cultural Ruth Costa promovem a programação na Yellow Zone, em Águas Lindas.
O ponto alto ocorre neste sábado (15): a Bicicletada Manifesto, com concentração às 7h, no Espaço Cultural Ruth Costa.
A pedalada segue até a Marcha Global pelo Clima, organizada pela Cúpula dos Povos, onde será entregue uma carta política com reivindicações e alternativas ao modelo urbano que marginaliza modos de transporte de baixo carbono.
Além do ParáCiclo e da UCB, participam a COP das Baixadas/Yellow Zone, o Pedal na Quebrada (SP), a Ciclocidade (SP) e outros coletivos de mobilidade ativa.
Mulher preta e moradora da periferia da Grande Belém, Ruth Costa usa bike todos os dias e ilustra o perfil do ciclista na região
Divulgação
Transporte para trabalhar
Os resultados mostram um uso intenso e cotidiano da bicicleta:
92,5% pedalam cinco ou mais dias por semana;
63,8% das viagens têm relação com trabalho;
80% dos ciclistas são trabalhadores de Serviços Operacionais — motoboys de bike, vendedores ambulantes, operadores, trabalhadores informais, cuidadores;
85,8% se declaram pretos ou pardos;
76% têm mais de 35 anos.
Ou seja, o pedal em Belém não é hobby: é ferramenta de trabalho, sustento e sobrevivência.
“Em meio à crise climática, as comunidades periféricas são as mais atingidas. Então é urgente que elas se organizem e fortaleçam uma consciência política e cidadã”, afirma Ruth Costa, diretora do ParáCiclo e responsável pelo Espaço Cultural Ruth Costa.
Metodologia da pesquisa
Os números que chamam atenção fazem parte de um recorte planejado. A contagem de 84.773 viagens foi feita em 7 pontos estratégicos — locais de fluxo intenso e ligações importantes entre bairros. Não se trata de medir a cidade inteira, mas de observar profundamente áreas-chave para entender os padrões de deslocamento.
Para estimativas gerais, Belém tem outro dado robusto: cerca de 12% da população usa bicicleta como principal modo de transporte, segundo o IBGE.
Já a Pesquisa Origem-Destino não mede volume de viagens, mas quem são os ciclistas: perfil social, renda, raça/cor, motivos das viagens, relação com o território e com o trabalho. Ela complementa a contagem com profundidade qualitativa.
VÍDEOS com as principais notícias do ParáFONTE: https://g1.globo.com/pa/para/noticia/2025/11/15/bicicleta-evita-o-uso-de-ao-menos-200-onibus-por-dia-em-belem-mas-esta-fora-do-debate-na-cop30-dizem-ativistas.ghtml